quarta-feira, 4 de novembro de 2009

#Sem Limite De Caracteres

A linguagem é um instrumento polivalente. E barato. Não pagámos por isso, ou melhor, não pagávamos, porque antigamente era tudo mais verbal e,  ainda que, por vezes, o que ouvíamos  nos fizesse desejar,l um imposto aplicado aos absurdos vociferados por indivíduo - tributação suficiente para sufocar gritantes buracos orçamentais - nenhum governo democrático ousaria tapar a boca dos cidadãos e, então, falava-se muito. Do país e do sistema, da camada de ozono, do cantor com a actriz e da vizinha de cima. Falava-se bem e mal, certo ou errado, mas falava-se. Falar mesmo, com sotaque do norte, do sul ou do centro.
Agora não. Agora há diálogos mudos, discussões de zero décibeis. As conversas sonorizam-se pelo dedilhar de mensagens no telemóvel ou fazem-se ouvir na cadência muda da digitação a computador. Antes não. Antes ficávamos horas a interpretar a entoação das frases, os gestos que as acompanhavam e tudo que poderia estar além do que tinha sido proferido. Era sempre mais real, melhor vivido; mais humano e mais palpável, mais "humanizável".

Hoje interpretam-se silêncios físicos pontuados por palavras inanimadas. Não há pormenores que falham ou se acrescem aquando a milésima vez que contamos, porque foi salvo em memória artificial o registo literal. Guardam-se momentos em ficheiros informáticos e concretizam-se num intervalo do dia, rigorosamente programado em agenda electrónica.
Hoje tomam-se decisões de vida na ponta dos dedos e, quando as recordamos, não há o timbre da voz a ecoar cá dentro; recorremos, apenas, ao que fica gravado no "correio enviado".



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